ORGANIZAR
E ANALISAR DADOS
Organizar
e Analisar Dados: O principal desafio do grupo de
investigação é diferenciar as informações precisas das imprecisas, fatores
pertinentes ao evento das irrelevantes, de modo a identificar de fato o que
ocorreu, como ocorreu e as causas reais do incidente.
É importante lembrar que o propósito maior da
investigação é evitar a recorrência de eventos similares e não,
apontar culpados, identificando quem errou.
Isto
requer uma ação conjugada de análise e de coleta de dados por meio de:
ü Entendimento
da atividade que estava sendo executada no momento da ocorrência do incidente;
ü Avaliação
e análise da cena do incidente;
ü Identificação
de fatos que são inconsistentes com outras evidências;
ü Confirmação
de conclusões através de evidências de testemunho, físicas e/ou documentais;
ü Realização
de testes, inspeções, ensaios de componentes, peças e materiais para determinar
as falhas e prover a evidência física e
ü Análise
de políticas, procedimentos e registros de trabalho para identificar o nível de
conformidade no momento e no cenário do incidente.
O primeiro passo no processo de análise
é selecionar a ferramenta ou o método que será utilizado para a
condução da descoberta das causas do incidente. Certamente que o método foi
pré-selecionado no processo de constituição do grupo de investigação, pois um
dos pré-requisitos para constituir o grupo é a presença de pelo menos um
membro com domínio no uso do método ou ferramenta de análise.
O passo seguinte é a organização dos dados
coletados de modo que se obtenha uma descrição cronológica dos
eventos que levaram ao incidente. Nem sempre conseguimos identificar todos os
fatos que resultaram num incidente com clareza. Nestes casos, é comum
criarmos hipóteses baseadas em opiniões, conjecturas que tentam explicar a
ocorrência do incidente.
Certamente, estas hipóteses precisam ser verificadas e
validadas com base em evidências de testemunhos, evidências físicas e/ou
documentais para que sejam aceitas como fatos. A construção da linha do tempo
mencionada na etapa de coleta de dados (vide artigo Coleta de Dados para a
investigação do incidente) é o ponto de partida para o desenvolvimento da
cronologia dos eventos, apoiado pelas outras evidências coletadas.
A grande maioria dos métodos e ferramentas empregadas
na análise de incidentes adota a representação gráfica para a identificação das
causas
A grande maioria dos métodos e ferramentas empregadas
na análise de incidentes adota a representação gráfica para a
identificação das causas, o que por si só, já constitui uma forma de
organizar não somente os dados coletados, mas o pensamento na descrição de como
o incidente ocorreu.
Fatos e evidências mais tarde avaliados como
irrelevantes devem ser removidos da cronologia da ocorrência, mas mantidos no
arquivo das evidências.
O produto esperado desta etapa de organizar e analisar
dados, ilustrado na figura 1 é a identificação das causas que levaram à
ocorrência que está sendo investigada.
Causas
ou fatores causais são os eventos e as condições que produziram ou contribuíram
para a ocorrência do incidente e podem ser classificadas como:
a.) Causas diretas ou
imediatas: aquelas que imediatamente antecederam e resultaram no incidente.
b.) Causas contribuintes:
aquelas associadas ao ambiente, à gestão, à tarefa que poderiam ter evitado que
a ação imediata resultasse no incidente.
c.) Causas básicas ou
fundamentais ou causas raiz: aquelas associadas a decisões e ações
organizacionais e/ou sistêmicas que poderiam evitar ou que até fomentaram as
ações na classe de causas contribuintes.
Figura
1 – Processo de organização e análise de dados
Metaforicamente podemos associar esta classificação de
causas com um iceberg: a causa direta ou imediata é aquela que está na
superfície, é facilmente visível e antecede ao incidente. A causa
contribuinte não é visível, pois está abaixo da linha d’água, mas é acessível,
pois pode ser facilmente identificada pela proximidade com a superfície.
Nas análises, as causas contribuintes costumam ser
associadas às condições do ambiente ou da tarefa, denominadas de condições
inseguras. Porém, as causas básicas, fundamentais ou causas raiz estão em nível
mais profundo e são invisíveis aos olhos de quem está na superfície. Para
identificá-las é preciso ter disposição para mergulhar fundo e por
isso precisamos de uma boa ferramenta de análise, que nos ajude a fazer
esse mergulho de forma segura.
A questão básica é o como se mergulha no iceberg de
causas para identificar as causas imediatas e básicas, já que as causas
imediatas são as visíveis. O próprio método ou ferramenta de análise vai
conduzir a esta identificação, se aplicada e utilizada adequadamente. Porém,
independentemente do método utilizado, algumas perguntas podem ajudar a
identificar os fatores causais como, por exemplo:
a.)
Por que a situação observada existia?
ü Havia
falha em equipamento?
ü O
que causou a falha do equipamento?
ü O
projeto da máquina era deficiente?
ü Havia
substância perigosa envolvida?
ü As
substâncias perigosas estavam perfeitamente identificadas?
ü Havia
ou há alguma substância alternativa menos perigosa?
ü Havia
alguma matéria-prima fora do padrão?
ü Era
necessário e recomendado o uso de algum EPI?
ü Os
EPI recomendados estavam disponíveis, em bom estado e estavam sendo utilizados
de forma adequada?
b).
O que aconteceu de diferente antes do incidente?
ü Quais
eram as condições de tempo?
ü Desordem
constituía um problema?
ü Estava
muito quente ou muito frio?
ü Havia
problema com ruído?
ü A
iluminação era adequada?
ü Havia
presença de gases tóxicos, perigosos, poeiras ou fumos?
ü Alguma
condição mudou que pudesse tornar o procedimento usual inseguro?
c.)
E as pessoas envolvidas?
ü Havia
pessoas experientes executando o trabalho?
ü As
pessoas foram adequadamente treinadas?
ü O
trabalho era fisicamente possível de ser conduzido por aquelas pessoas?
ü Qual
era o estado de saúde das pessoas?
ü Estavam
usando alguma medicação? Qual?
ü Estas
pessoas estavam cansadas?
ü Qual
foi seu regime de trabalho anterior ao acidente?
ü Estas
pessoas estavam estressadas?
ü É
possível identificar algum problema pessoal envolvendo o acidentado antes do
incidente?
d.)
E os aspectos do gerenciamento?
ü As
regras e padrões de segurança foram comunicados e entendidos por todos
empregados?
ü Haviam
procedimentos escritos?
ü Os
procedimentos eram reforçados?
ü Havia
supervisão adequada?
ü As
pessoas foram treinadas para execução daquele trabalho?
ü As condições
perigosas haviam sido previamente identificadas?
ü Procedimentos
foram desenvolvidos para fazer face às condições perigosas de maior risco
identificadas?
ü As
condições inseguras foram corrigidas?
ü A
manutenção dos equipamentos era conduzida regularmente?
ü Existiam
inspeções de segurança regulares e sistemáticas?
e.)
Se não, por que não?
O procedimento seguro era
utilizado?
Ferramentas e materiais
apropriados estavam disponíveis?
Ferramentas e materiais
apropriados disponíveis estavam sendo utilizados?
Os dispositivos de
segurança estavam em perfeito estado de funcionamento?
Cadeados e travas estavam
sendo utilizados onde necessário?
Durante o processo de análise é importante considerar
que os incidentes não têm causa única, não acontecem por acaso, mas são
construídos ao longo do tempo. Portanto, o propósito é identificar o que
aconteceu e como aconteceu e uma regra básica, na condução da análise,
é não prejulgar e não concluir nada que não seja fundamentado em fatos e
dados, com uso das evidências coletadas, sejam elas de testemunhas, físicas ou
documentais.
Ideias pré-concebidas “cegam” e podem conduzir ao
caminho errado e assim validar causas que, se abordadas e eliminadas, não serão
suficientes para prevenir ocorrências similares no futuro.
Ideias pré-concebidas “cegam” e podem conduzir ao
caminho errado e assim validar causas que, se abordadas e eliminadas, não serão
suficientes para prevenir ocorrências similares no futuro.
Adicionalmente, é preciso rigor e cuidado para não ficar na
superfície e elencar apenas as causas visíveis, que na prática são muito mais
efeito do que propriamente uma causa. E, sabidamente as ações sobre
efeitos removem apenas os sintomas. Sem atacar de fato as causas
fundamentais ou causas raiz, não estaremos aprendendo com os eventos
indesejáveis e, certamente, eles se repetirão.
Em se tratando de um ritual e considerando que as
ações do aprendizado para com o incidente devem ser registradas, observe os
documentos e registros pertinentes a esta etapa, indicados na figura 1
No próximo artigo abordaremos a etapa 7 do ritual de
aprendizado para com o incidente, que é elaborar conclusões e propor ações
para prevenir a recorrência de eventos similares e/ou mitigar suas
consequências caso ocorram novamente.
Autor:
Reginaldo Pedreira Lapa
Engenheiro de Minas e de Segurança do Trabalho
Fonte:
Lapa, Reginaldo Pedreira. Investigação e Análise de Incidentes, Editora Edicon,
São Paulo, 2011
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