sexta-feira, 13 de maio de 2022

 

 

 

ORGANIZAR E ANALISAR DADOS

 



Organizar e Analisar Dados: O principal desafio do grupo de investigação é diferenciar as informações precisas das imprecisas, fatores pertinentes ao evento das irrelevantes, de modo a identificar de fato o que ocorreu, como ocorreu e as causas reais do incidente.

 

É importante lembrar que o propósito maior da investigação é evitar a recorrência de eventos similares e não, apontar culpados, identificando quem errou.

 

Isto requer uma ação conjugada de análise e de coleta de dados por meio de:

 

ü Entendimento da atividade que estava sendo executada no momento da ocorrência do incidente;

ü Avaliação e análise da cena do incidente;

ü Identificação de fatos que são inconsistentes com outras evidências;

ü Confirmação de conclusões através de evidências de testemunho, físicas e/ou documentais;

ü Realização de testes, inspeções, ensaios de componentes, peças e materiais para determinar as falhas e prover a evidência física e

ü Análise de políticas, procedimentos e registros de trabalho para identificar o nível de conformidade no momento e no cenário do incidente.

 

O primeiro passo no processo de análise é selecionar a ferramenta ou o método que será utilizado para a condução da descoberta das causas do incidente. Certamente que o método foi pré-selecionado no processo de constituição do grupo de investigação, pois um dos pré-requisitos para constituir o grupo é a presença de pelo menos um membro com domínio no uso do método ou ferramenta de análise.

 

O passo seguinte é a organização dos dados coletados de modo que se obtenha uma descrição cronológica dos eventos que levaram ao incidente. Nem sempre conseguimos identificar todos os fatos que resultaram num incidente com clareza. Nestes casos, é comum criarmos hipóteses baseadas em opiniões, conjecturas que tentam explicar a ocorrência do incidente.

 

Certamente, estas hipóteses precisam ser verificadas e validadas com base em evidências de testemunhos, evidências físicas e/ou documentais para que sejam aceitas como fatos. A construção da linha do tempo mencionada na etapa de coleta de dados (vide artigo Coleta de Dados para a investigação do incidente) é o ponto de partida para o desenvolvimento da cronologia dos eventos, apoiado pelas outras evidências coletadas. 

 



A grande maioria dos métodos e ferramentas empregadas na análise de incidentes adota a representação gráfica para a identificação das causas

 

A grande maioria dos métodos e ferramentas empregadas na análise de incidentes adota a representação gráfica para a identificação das causas, o que por si só, já constitui uma forma de organizar não somente os dados coletados, mas o pensamento na descrição de como o incidente ocorreu.

 

Fatos e evidências mais tarde avaliados como irrelevantes devem ser removidos da cronologia da ocorrência, mas mantidos no arquivo das evidências.

 

O produto esperado desta etapa de organizar e analisar dados, ilustrado na figura 1 é a identificação das causas que levaram à ocorrência que está sendo investigada.

 

Causas ou fatores causais são os eventos e as condições que produziram ou contribuíram para a ocorrência do incidente e podem ser classificadas como:

 

a.) Causas diretas ou imediatas: aquelas que imediatamente antecederam e resultaram no incidente.

b.) Causas contribuintes: aquelas associadas ao ambiente, à gestão, à tarefa que poderiam ter evitado que a ação imediata resultasse no incidente.

c.) Causas básicas ou fundamentais ou causas raiz: aquelas associadas a decisões e ações organizacionais e/ou sistêmicas que poderiam evitar ou que até fomentaram as ações na classe de causas contribuintes.

 

Figura 1 – Processo de organização e análise de dados

 

Metaforicamente podemos associar esta classificação de causas com um iceberg: a causa direta ou imediata é aquela que está na superfície, é facilmente visível e antecede ao incidente. A causa contribuinte não é visível, pois está abaixo da linha d’água, mas é acessível, pois pode ser facilmente identificada pela proximidade com a superfície.

 

Nas análises, as causas contribuintes costumam ser associadas às condições do ambiente ou da tarefa, denominadas de condições inseguras. Porém, as causas básicas, fundamentais ou causas raiz estão em nível mais profundo e são invisíveis aos olhos de quem está na superfície. Para identificá-las é preciso ter disposição para mergulhar fundo e por isso precisamos de uma boa ferramenta de análise, que nos ajude a fazer esse mergulho de forma segura.

 

A questão básica é o como se mergulha no iceberg de causas para identificar as causas imediatas e básicas, já que as causas imediatas são as visíveis. O próprio método ou ferramenta de análise vai conduzir a esta identificação, se aplicada e utilizada adequadamente. Porém, independentemente do método utilizado, algumas perguntas podem ajudar a identificar os fatores causais como, por exemplo:

 

a.) Por que a situação observada existia?

 

ü Havia falha em equipamento?

ü O que causou a falha do equipamento?

ü O projeto da máquina era deficiente?

ü Havia substância perigosa envolvida?

ü As substâncias perigosas estavam perfeitamente identificadas?

ü Havia ou há alguma substância alternativa menos perigosa?

ü Havia alguma matéria-prima fora do padrão?

ü Era necessário e recomendado o uso de algum EPI?

ü Os EPI recomendados estavam disponíveis, em bom estado e estavam sendo utilizados de forma adequada?

 

b). O que aconteceu de diferente antes do incidente?

 

ü Quais eram as condições de tempo?

ü Desordem constituía um problema?

ü Estava muito quente ou muito frio?

ü Havia problema com ruído?

ü A iluminação era adequada?

ü Havia presença de gases tóxicos, perigosos, poeiras ou fumos?

ü Alguma condição mudou que pudesse tornar o procedimento usual inseguro?

 

c.) E as pessoas envolvidas?

 

ü Havia pessoas experientes executando o trabalho?

ü As pessoas foram adequadamente treinadas?

ü O trabalho era fisicamente possível de ser conduzido por aquelas pessoas?

ü Qual era o estado de saúde das pessoas?

ü Estavam usando alguma medicação? Qual?

ü Estas pessoas estavam cansadas?

ü Qual foi seu regime de trabalho anterior ao acidente?

ü Estas pessoas estavam estressadas?

ü É possível identificar algum problema pessoal envolvendo o acidentado antes do incidente?

 

d.) E os aspectos do gerenciamento?

 

ü As regras e padrões de segurança foram comunicados e entendidos por todos empregados?

ü Haviam procedimentos escritos?

ü Os procedimentos eram reforçados?

ü Havia supervisão adequada?

ü As pessoas foram treinadas para execução daquele trabalho?

ü As condições perigosas haviam sido previamente identificadas?

ü Procedimentos foram desenvolvidos para fazer face às condições perigosas de maior risco identificadas?

ü As condições inseguras foram corrigidas?

ü A manutenção dos equipamentos era conduzida regularmente?

ü Existiam inspeções de segurança regulares e sistemáticas?

 

e.) Se não, por que não?

 

O procedimento seguro era utilizado?

Ferramentas e materiais apropriados estavam disponíveis?

Ferramentas e materiais apropriados disponíveis estavam sendo utilizados?

Os dispositivos de segurança estavam em perfeito estado de funcionamento?

Cadeados e travas estavam sendo utilizados onde necessário?

 

Durante o processo de análise é importante considerar que os incidentes não têm causa única, não acontecem por acaso, mas são construídos ao longo do tempo. Portanto, o propósito é identificar o que aconteceu e como aconteceu e uma regra básica, na condução da análise, é não prejulgar e não concluir nada que não seja fundamentado em fatos e dados, com uso das evidências coletadas, sejam elas de testemunhas, físicas ou documentais.

 



Ideias pré-concebidas “cegam” e podem conduzir ao caminho errado e assim validar causas que, se abordadas e eliminadas, não serão suficientes para prevenir ocorrências similares no futuro.

 

Ideias pré-concebidas “cegam” e podem conduzir ao caminho errado e assim validar causas que, se abordadas e eliminadas, não serão suficientes para prevenir ocorrências similares no futuro. Adicionalmente, é preciso rigor e cuidado para não ficar na superfície e elencar apenas as causas visíveis, que na prática são muito mais efeito do que propriamente uma causa. E, sabidamente as ações sobre efeitos removem apenas os sintomas. Sem atacar de fato as causas fundamentais ou causas raiz, não estaremos aprendendo com os eventos indesejáveis e, certamente, eles se repetirão.

 

Em se tratando de um ritual e considerando que as ações do aprendizado para com o incidente devem ser registradas, observe os documentos e registros pertinentes a esta etapa, indicados na figura 1

 

No próximo artigo abordaremos a etapa 7 do ritual de aprendizado para com o incidente, que é elaborar conclusões e propor ações para prevenir a recorrência de eventos similares e/ou mitigar suas consequências caso ocorram novamente.

 

Autor: Reginaldo Pedreira Lapa
Engenheiro de Minas e de Segurança do Trabalho

 

Fonte: Lapa, Reginaldo Pedreira. Investigação e Análise de Incidentes, Editora Edicon, São Paulo, 2011

 

 



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DOCUMENTAR O RITUAL

 

 

O foco central da etapa de documentar o ritual da investigação, ilustrado na figura 1, é a preparação do relatório da investigação. Este relatório é o documento que registra todo o ritual da investigação em todas as suas etapas: comunicação da ocorrência, ações imediatas adotadas, a constituição do grupo de investigação, o planejamento da investigação, a coleta de dados, a seleção do método de análise a organização dos dados, a análise propriamente dita, descrevendo como o evento ocorreu e quais foram as causas identificadas, as conclusões e as ações propostas devidamente avaliadas e priorizadas.

 

O relatório será utilizado para transmitir a outras pessoas da organização e, mesmo, partes interessadas externas, quando pertinente, o que aconteceu de fato, em termos descritivos e cronológicos, por que aconteceu, elencando os fatores de causa determinantes e o que pode ser feito para evitar a ocorrência de eventos similares no futuro.

 

Portanto, o relatório da investigação é o registro oficial da investigação e a qualidade dessa investigação, muitas vezes é avaliada a partir do seu relatório. Ao estruturar e redigir o relatório é importante considerar que os leitores do mesmo não participaram da investigação e pode ser mesmo alguém que não conheça o processo no qual o incidente ocorreu. Portanto, fotografias, desenhos, esquemas, fluxos e outras ilustrações podem ser úteis para a compreensão de ideias e situações que se queira apresentar, além de economizar descrições às vezes enfadonhas e cansativas para a leitura.

 

Lembre-se que um bom relatório de investigação não é avaliado apenas pelo seu número de páginas.

 

Figura 1 – Processo de documentar o ritual da investigação

 

Até que se obtenha um bom relatório, às vezes é necessário escrevê-lo várias vezes, razão pela qual é recomendável produzir uma minuta do mesmo e revisá-lo tantas vezes quanto for necessário, até que ele esteja pronto para ser apresentado à administração da empresa, a quem cabe aprová-lo formalmente.

 

Isto significa que a documentação do ritual da investigação é um processo interativo que pode ainda ser melhorado antes da aprovação final da administração. Dependendo da complexidade da investigação e de seus desdobramentos, pode ser útil uma revisão por parte de profissionais da área jurídica da empresa, assim como é essencial uma revisão gramatical, ortográfica e mesmo uma crítica na estrutura, abordagem e diagramação do mesmo.

 

Sabidamente, temos a tendência de nos “viciar” na leitura de algum documento que redigimos e que visitamos várias vezes, o que acontece com o relatório do ritual da investigação. Também é sabido que elaborar um relatório de investigação demanda tempo e dedicação e que, portanto, esta tarefa não pode ser deixada para ser feita na última hora. É preciso incluir no planejamento da investigação a tarefa de redação do relatório.

 

Pensando nisso, sugerimos:

 

·       Definir a estrutura do relatório previamente na fase de planejamento da investigação;

·       Distribuir a tarefa de redação entre os membros do grupo de modo que cada membro tenha a responsabilidade de produzir partes do relatório;

·       Começar a redação assim que possível e nas etapas iniciais do ritual da investigação. Isto ajuda a não se esquecer de registrar fatos relevantes observados;

·       Concentrar em alguém a estruturação do documento, com base nas partes descritas pelos membros e o controle das revisões do documento, de modo a evitar perdas e retrabalho;

·       Assegurar que as descrições de parte do relatório de cada membro sejam compartilhadas com o grupo, pois isso ajuda na uniformização da abordagem e na conexão entre as descrições de cada membro;

·       Planejar a produção de ilustrações, figuras, fluxos e desenhos, pois isso toma tempo e pode atrasar a produção do relatório se esta tarefa for deixada para o final.

·       Atualmente, o meio eletrônico é a ferramenta utilizada para a edição de relatórios. Assim sendo, é fundamental que seja considerada a segurança da informação, mantendo cópias de back-up atualizadas das produções dos textos, desenhos, figuras e ilustrações.

 



Pode ser útil uma revisão por parte de profissionais da área jurídica da empresa, assim como é essencial uma revisão gramatical e ortográfica.

 

Uma estrutura comum em relatórios de investigação inclui:

 

·       Um sumário executivo: apresentação de um resumo da investigação não mais longo que uma página, indicando brevemente o que ocorreu, o que poderia ocorrer de mais sério, quais foram as ações imediatas adotadas, o método selecionado para a análise, as causas identificadas, que recomendações foram feitas e que ações foram indicadas com o respectivo resultado da análise de efetividade e de priorização.

 

·       Justificativa: descrever os motivos que justificam a investigação. Às vezes o evento investigado não teve consequências reais maiores, mas tinha o potencial de ter sido catastrófico e assim merece uma investigação mais profunda. Adicionalmente, pode-se aqui utilizar o potencial de severidade da ocorrência para justificar a investigação.

 

·       Sequência dos eventos: descreve a sequência cronológica dos eventos evitando os detalhes. Se necessário, detalhes devem ser indexados como anexos.

 

·       Consequências: apresenta a descrição das consequências do evento as quais podem incluir informações sobre pessoas lesionadas, impacto ambiental, interrupção e perda de produção, custos de reparos ambientais, a perda de produção, de reparos a danos físicos em equipamentos e instalações, referências a despesas médicas, despesas com seguros, custos judiciais, custos trabalhistas etc.

 

·       O método de investigação e as causas identificadas: justificando a escolha do método de análise selecionado e apresentando as causas imediatas, as contribuintes e as causas fundamentais ou causas raiz devidamente justificadas e fundamentadas pelas evidências coletadas.

 

·       Conclusões e ações propostas: apresentar as conclusões, as ações de controle propostas devidamente classificadas de acordo com a hierarquia de controle, juntamente com a análise de efetividade e a análise de priorização.

 

·       Agradecimentos: sempre que existirem fatos que justifiquem, é importante registrar o agradecimento do grupo de investigação, reconhecendo pessoas ou grupos de pessoas que tenham de fato dado contribuição relevante durante o ritual da investigação.

 

·       Anexos: nos anexos devem ser inseridas informações pertinentes coletadas e que deram suporte à análise e às conclusões como desenhos, fluxos, cálculos, imagens, diagramas de análise de causas, devidamente classificados tais como:

 

ü Anexo A – Legislação e Padrões de Segurança

ü Anexo B – Fluxograma do processo

ü Anexo C – Grupo de Investigação

ü Anexo D – Lista de evidências físicas

ü Anexo E – Lista de entrevistas de testemunhas

ü Anexo F – Lista de evidências documentais

ü Anexo G – Linha do tempo do evento

ü Anexo H– Lista de imagens

ü Anexo I – Diagrama de análise de causas

ü Anexo J – Outros

 

Uma vez aprovado o relatório o mesmo deve ser enviado para as partes interessadas tanto internas quanto externas, quando pertinente. Nestes casos, algumas organizações têm como prática a produção de edições especificas de relatórios de investigação para públicos específicos, sem perda da informação fundamental do que ocorreu, como ocorreu, quais foram os fatores determinantes da ocorrência, as recomendações e ações definidas para evitar a recorrência ou uma combinação dessas informações de acordo com o propósito e o destinatário.

 

Não é incomum que a etapa de aprovação do relatório seja antecipada por uma apresentação do seu conteúdo com uso de multimídia. Neste caso, a apresentação também precisa ser preparada e ser produzida com objetividade. O sumário do relatório da investigação do incidente pode ser um bom guia para a preparação da apresentação.

 

Invariavelmente, todo incidente tem potencial para nos ensinar lições o que denominamos “aprender com os incidentes”. O primeiro nível de aprendizado é o aprendizado local, isto é, na unidade ou processo no qual o evento indesejado aconteceu. Assim sendo, um sumário das lições aprendidas precisa ser preparado para disseminação local, às vezes regionais ou mesmo abrangendo outras unidades além-continente. Na prática, este aprendizado começa quando o evento acontece, através do comunicado para todas as pessoas do ocorrido e é concluído quando termina o ritual da investigação, comunicando de maneira formal às pessoas da organização as lições aprendidas com a ocorrência, através das conclusões do ritual da investigação do mesmo.

 

Em se tratando de um ritual e considerando que as ações do aprendizado para com o incidente devem ser registradas, observe os documentos e registros pertinentes a esta etapa, indicados na figura 1.

No próximo artigo abordaremos a etapa 9, a última etapa do ritual de aprendizado para com o incidente, que aborda o acompanhamento das ações propostas para evitar recorrência em termos de execução física e efetividade da ação.

 

Autor: Reginaldo Pedreira Lapa
Engenheiro de Minas e de Segurança do Trabalho

 

Fonte: Lapa, Reginaldo Pedreira. Investigação e Análise de Incidentes, Editora Edicon, São Paulo, 2011

 

 

 

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