CULTURA
NA MITIGAÇÃO DE RISCO DE SEGURANÇA E SAÚDE OCUPACIONAL:
UM
ESTUDO PILOTO DE SEGURANÇA EM ELETRICIDADE
ARTIGO
ORIGINAL
RESUMO
Esforços têm sido feitos há anos para minimizar os
riscos de Segurança e Saúde no Trabalho (SST), mas os registros de lesões
continuam sendo um motivo constante de preocupações em todo o mundo. Muitas
empresas frequentemente implementam a tecnologia como uma hierarquia
administrativa de controle. No entanto, as tecnologias também podem influenciar
ativamente as práticas seguras no nível gerencial para o administrativo. Esta
pesquisa examina os riscos de segurança elétrica na construção civil, como base
para o estudo da viabilidade do uso de tecnologia destinada à integração da
cultura de segurança no nível administrativo de mitigação de riscos de SST. É
introduzido o conceito “habitus” (hábito), que sugere uma possibilidade para o
estabelecimento de uma cultura que aumente o desempenho de segurança dos
trabalhadores e se integre às suas práticas por meio da tecnologia da
informação de ponta. Um aplicativo protótipo para treinamento em SST baseado em
tecnologia de Realidade Virtual Móvel (MVR) é demonstrado para ajudar a
estabelecer hábitos nas práticas diárias dos trabalhadores em uma empresa do
ramo estudado e, em última análise, mitigar os riscos de SST no nível
administrativo de projetos de construção. Embora seja um estudo piloto em
segurança elétrica, sua aplicação não se limita a esta área e é escalável para
outros riscos de SST.
Palavras-chave:
Segurança do Trabalho, Saúde Ocupacional, Segurança Elétrica, Gestão de Riscos.
1.
INTRODUÇÃO
Componente chave da gestão de riscos para a indústria
é a área de Segurança e Daúde no Trabalho - SST. Esforços relevantes têm sido
feitos há anos para minimizar os riscos, mas os registros de lesões
relacionadas a SST, como lesões elétricas e outras fatalidades na construção
civil, continuam sendo um motivo constante de preocupações em todo o mundo. De
acordo com a Secretaria de Estatísticas Trabalhistas dos Estados Unidos, o
Bureau of Labor Statistics - BLS, a indústria de construção no país teve uma participação
desproporcional nas estatísticas de eletrocussão (Figura 1). Entre 2003 e 2011,
o setor de construção civil dos EUA contratou aproximadamente 5,05% de toda a
força de trabalho, mas esteve envolvido em 47,85% das lesões elétricas fatais.
Em 2011, a taxa de eletrocussão na construção nos EUA foi de 12,2 por milhão de
trabalhadores da construção em tempo integral, quase sete vezes a média para
toda a indústria.
Figura
1. Participação da Construção Civil nos EUA em Eletrocussão e Emprego,
2003–2011
Fonte: Bureau of Labor
Statistics dos EUA.
Pesquisas anteriores tentaram fornecer uma compreensão
sobre segurança e saúde no trabalho na construção (CYRAS e JARAS, 1996) e minimizar os perigos por meio da gestão de
riscos. Esta apresenta um conceito de reconhecimento e controle de risco com
antecedência, que inclui quatro processos principais: identificação, avaliação,
mitigação e prevenção de risco (ZAVADSKAS
et al., 2010). Destes processos, a ocorrência de risco tem sido considerada
uma consequência e não uma causa após a ação ou decisão que resulta em um ou
mais resultados negativos não intencionais (STRAUCH,
2002). A mitigação de riscos (ações e medidas aplicadas para reduzir a
probabilidade de ocorrência de um evento indesejável e seus efeitos) é um passo
preliminar para a ocorrência do risco e sua consequência em termos de gestão de
risco. No entanto, a maioria das pesquisas existentes se concentra na avaliação
de riscos e poucas se concentram nas técnicas de mitigação, especialmente na
segurança da construção civil (JANICAK,
2008).
Muitas empresas implementam sistemas como técnicas de
mitigação de riscos em um canteiro de obras. Esses sistemas oferecem a
capacidade de influenciar ativamente as práticas seguras no nível gerencial,
parte de uma hierarquia administrativa de controle. Assim, a presente pesquisa
examina os riscos de segurança elétrica na indústria de construção civil, como
base para o estudo da viabilidade do uso de tecnologia destinada à integração
da cultura de segurança no nível administrativo de mitigação de riscos de SST.
Diferente de sistemas puramente técnicos como os administrativos, esta pesquisa
tem o objetivo de apresentar uma abordagem inovadora de sistemas gerenciais
para mitigação de riscos de SST na construção civil. Introduz o conceito de
“habitus” (hábito) do trabalhador, um tipo de mudança cultural que pode
aumentar o desempenho de segurança e se integra às práticas relacionadas a SST
por meio de tecnologia da informação de ponta. Um aplicativo protótipo para
treinamento em SST baseado em tecnologia de Realidade Virtual Móvel (Mobile Virtual Reality – MVR) é
demonstrado para ajudar a estabelecer hábitos nas práticas diárias dos
trabalhadores e, em última análise, mitigar os riscos no nível administrativo
de projetos de construção.
2.
RISCO DE SST ELÉTRICA NA CONSTRUÇÃO
2.1
CAUSAS IMEDIATAS DE ELETROCUSSÃO
A pesquisa de Zhao et al. (2014) mostrou a
distribuição das causas de eletrocussão na construção civil dos EUA examinando
investigações de fatalidades (Figura 2). Entre 1989 e 2011, a principal causa
de morte elétrica foi contato direto. A segunda maior causa foi tocar em
máquinas como guindastes, caminhões basculantes ou outros veículos em expansão.
Outras causas incluem contato com equipamentos de apoio energizados (por
exemplo, escadas e andaimes) ou materiais condutores (tubos, postes etc.).
Figura
2. Causas imediatas de mortes por eletricidade na construção dos EUA, 1989–2011
Fonte:
Zhao et al. (2014).
As vítimas de eletrocussão incluíam trabalhadores da
eletricidade e trabalhadores de outras áreas. As ocupações elétricas incluem
eletricistas, instaladores e reparadores de energia elétrica, aprendizes e
ajudantes de eletricidade e seus supervisores. Apenas 26% das vítimas de mortes
elétricas eram eletricistas, enquanto o restante estava associado a outros
ofícios de construção (ZHAO et al.,
2014). Portanto, não apenas as ocupações elétricas foram expostas aos
riscos elétricos, mas também os trabalhadores de outras funções que precisavam
de atenção redobrada sobre os riscos elétricos e a segurança. Também é
importante observar que a maioria das electrocussões mencionadas acima teve
causas imediatas das quais a indústria tem conhecimento e cujas medidas de
prevenção foram documentadas em regulamentos, códigos e até procedimentos
diários de segurança. No entanto, uma grande quantidade de trabalhadores da
construção em todo o mundo ainda se machuca ou morre anualmente.
2.2 COMPORTAMENTOS DO TRABALHADOR
O erro humano tem sido considerado fator chave que
contribui para até 80% dos acidentes de trabalho nas indústrias de aviação,
petroquímica, saúde, construção civil, mineração e energia nuclear (GARRETT e TEIZER, 2009). Rasmussen
(1997) apresentou três tipos de desempenho no trabalho e seus erros associados:
baseado em habilidades, baseado em conhecimento e baseado em regras. Reason
(2000) combinou os erros baseados em conhecimento e erros baseados em regras em
“erros humanos” e, em seguida, acrescentou outras categorias de comportamento
de risco em três tipos: erros baseados em habilidades, erros e violações.
O erro baseado em habilidades resulta da capacidade
limitada de processamento de informações, incluindo atenção. Os erros
geralmente ocorrem quando um indivíduo não tem regras, ou “esquema”,
disponíveis para aplicar a uma situação ou aplica de forma errada. Os esquemas
são desenvolvidos através da aprendizagem experiencial, que pode ocorrer por
meio da exposição repetida a uma situação específica ou por meio de
oportunidades de aprendizado oferecidas em programas de treinamento. Além
disso, muitos consideram as violações diferentes dos erros por serem intencionais.
Como Strauch (2002) resumiu, os erros humanos geralmente envolvem a falha em
identificar os perigos envolvidos na conclusão de uma tarefa ou o uso incorreto
de equipamentos, enquanto as violações são normalmente relacionadas à falha em
seguir procedimentos organizacionais, tais como concluir uma auditoria de
segurança no trabalho ou usar equipamento de proteção individual.
Com base nos três tipos de comportamentos de risco dos
trabalhadores definidos por Reason (2000), os erros humanos são considerados a
principal razão para a maioria dos incidentes de SST. Há várias razões para os
erros humanos, sendo o treinamento insuficiente um dos mais significativos. Os
trabalhadores podem cometer erros se o treinamento não vier da experiência em
lidar com situações desconhecidas ou não forneça uma ampla gama de experiências
para entender quando as regras se aplicam, o que leva a interpretações errôneas
de uma situação e um má tomada de decisão (MANSEAU
e SHIELDS, 2005).
Read et al. (2012) utilizaram uma estrutura de fatores
contribuintes para verificar se os erros humanos estão associados à falta de
conhecimento, inexperiência na tarefa e deficiências no treinamento. Jaselskis
et al. (1996) argumentaram que as práticas inseguras muitas vezes levam a incidentes
ou acidentes, uma vez que a execução do trabalho é influenciada pela falta ou
menor frequência no treinamento de segurança. Em uma pesquisa com países
europeus, Teixeira et al. (2006) concluíram que a formação em SST é necessária
para a gestão de projetos de construção civil. Em outras palavras, um sistema
de treinamento de segurança adequado poderia reduzir os erros humanos, bem como
vários riscos em SST.
2.3
PRÁTICAS DE TREINAMENTO DE SEGURANÇA
Os empregadores da construção civil geralmente abordam
as práticas de SST para sua força de trabalho como parte da orientação geral de
treinamento dentro do programa de segurança das empresas. Muitas delas exigem
que os novos trabalhadores participem de treinamentos de no mínimo seis horas
para atender NR 18 (Segurança na Construção Civil) e, para os profissionais de
elétrica, no mínimo 40 horas para atender a NR 10 (Trabalho com Instalações
Elétricas), realizados por profissionais de Segurança e Saúde Ocupacional, com
validade de 1 ano.
Nos programas de treinamento padrão, as informações
são apresentadas por meio de slides ou do uso de fitas de vídeo, e são
reforçadas com apostilas e guias de estudo (ZHAO et al., 2009). Os questionários também são comumente usados e
incluídos em um pacote de treinamento para garantir a compreensão do material
abordado pelos treinandos.
Fora da sala de aula, o treinamento participativo (ou
seja, módulos de aprendizado ativo) tem sido amplamente aceito como uma das
abordagens de treinamento mais eficazes. Como ressaltado por Goldenhar et al.
(2001), a melhor maneira de treinar e aprender é fazer a coisa real e simular
as tarefas reais para obter experiência. No entanto, a maioria das práticas
atuais de treinamento em SST não está em um formato tão participativo e, como
resultado, pode ser menos eficaz. Devido ao ambiente de trabalho perigoso da
eletricidade, a segurança nesta área profissional apresenta um problema
especialmente difícil, pois alguns riscos de treinamento no trabalho não podem
permitir que os alunos ensaiem tarefas elétricas em uma situação real.
2.4
DESAFIOS PARA A CONSTRUÇÃO CIVIL
A construção civil é uma indústria baseada em
projetos. Cada projeto é único e requer que partes interessadas independentes
colaborem em vários estágios durante o ciclo de vida do projeto. Cada projeto
de construção civil pode ser considerado como uma organização multidisciplinar
que pode não continuar a trabalhar em conjunto uma vez que o projeto esteja
concluído (KAMARA et al., 2002).
Além disso, a contratação elétrica é altamente conectada por natureza, o que
significa que cada parte interessada afeta e é altamente dependente de
upstream[2] e downstream[3] de trabalho para orçamento, cronograma e segurança
(HANNA e HADDAD, 2009). Essa
natureza única de construção, fragmentação pesada e estrutura conectiva tornam
a construção civil um processo significativamente complexo. Além disso, a
construção é trabalhosa, com alta rotatividade de mão de obra, o que pode
tornar o gerenciamento de riscos mais difícil do que em outros setores.
Essas características muitas vezes restringem a
capacidade das plataformas e formatos tradicionais de treinamento em SST de
serem eficazes. Em primeiro lugar, enquanto a indústria manufatureira tem
instalações fixas, os trabalhadores da construção estão continuamente se
movendo entre diferentes canteiros de obras. Torna-se difícil, então, que seja
fornecido um local de treinamento exclusivo para cada tipo de risco. Em segundo
lugar, em comparação com as ações comumente repetidas das linhas de produção,
todo projeto de construção é insubstituível e restringe o trabalho que muitas
vezes é altamente específico. Em terceiro lugar, treinar trabalhadores não é
fácil em uma indústria caracterizada por pequenas empresas com baixas despesas
gerais e alta mobilidade de funcionários. Por exemplo, nos Estados Unidos, 92%
das 1,25 milhão de empresas de construção têm menos de 20 pessoas.
3.
MITIGAÇÃO DE RISCOS DE SST: UMA INOVAÇÃO COM CULTURA DE SEGURANÇA
A literatura sugere que procedimentos inseguros e
violações por parte dos trabalhadores, como esquecimento, negligência e
imprudência, são as principais causas que levam a lesões de SST (KLETZ, 2001). Há oportunidade de
reduzir comportamentos inseguros por meio de treinamento adequado e eficaz,
mesmo que não possam ser eliminados completamente. Goldenhar et al. (2001)
destacaram que a maneira mais direta de mudar as estatísticas de erros humanos
era por meio do treinamento eficaz dos trabalhadores. Neville (1998) sugeriu
que programas de treinamento eficazes poderiam ajudar a economizar grandes
custos prevenindo acidentes. O treinamento eficaz não apenas salva vidas, mas
também elimina os custos indiretos extras associados a investigações de
acidentes, taxas de seguro, tempo de inatividade de equipamentos e reparos e
perdas de produtividade.
A natureza da construção civil baseada em projetos
introduz barreiras adicionais à gestão de riscos de SST, exigindo inovações que
proporcionem benefícios a toda a indústria em oposição a riscos específicos
para locais individuais. Toole (1998, p. 2) definiu o processo de inovação como
“aplicação de tecnologia que é nova para uma organização e que melhora
significativamente o projeto e a construção, diminuindo o custo, aumentando o
desempenho e melhorando o processo de negócios”. Gann e Salter (2000)
descobriram que as empresas baseadas em projetos dependem da combinação de
conhecimentos técnicos de outras organizações para fornecer suas próprias
capacidades técnicas, geralmente em processos pontuais.
Nos negócios de construção civil, as inovações de SST
estão frequentemente relacionadas à engenharia ergonômica para melhorar a saúde
e aumentar a segurança. Com o tempo, os empreiteiros procuraram instituições de
ensino para fornecer um quadro de funcionários de construção civil qualificados
para trazer novas tecnologias de construção para a força de trabalho. Além
disso, a indústria da construção está particularmente ansiosa em buscar novas
tecnologias para controlar os riscos na variabilidade do local, natureza
pontual, longevidade das garantias e outras incertezas inerentes ao ambiente
construído (MCCOY, 2009). Até o
momento, a maioria dos controles de segurança utiliza inovações diretamente
aplicadas à melhoria da segurança em um “caminho técnico” (Zhao et al., 2014): por exemplo, a melhoria dos Equipamentos de
Proteção Individual - EPI.
No entanto, inovações de controle desse “caminho
técnico” (como EPI) só podem impactar a parte interessada essencial de SST –
pessoal – de maneira passiva (Figura 3), o que pode diminuir cumulativamente a
eficácia da adoção de tecnologia inovadora na mitigação de riscos de SST. A
rápida adoção de tecnologias ergonômicas, de saúde e segurança, como cintos de
segurança, pode até incomodar, impedir e retardar os trabalhadores
individualmente, fazendo com que resistam à inovação. Em contraste, os
controles administrativos que são inovações de “caminho gerencial” (ZHAO et al., 2014) relacionam a
tecnologia de forma indireta, mas também podem impactar a adoção de SST pelos
trabalhadores de maneira ativa. Em outras palavras, apesar da adoção direta de
novas tecnologias, a inovação cultural é uma força poderosa que pode moldar a
eficácia geral do projeto e o sucesso de longo prazo da empresa de construção (YITMEN, 2007). A cultura de segurança influência
de forma inconsciente e consistente todos os aspectos da vida organizacional,
como a atitude dos trabalhadores em relação à segurança e seu processo de
decisão durante importantes atividades de SST na construção.
Figura
3. Caminho gerencial para a mitigação do risco de SST
Fonte:
Zhao et al. (2014).
A literatura sugere que é um desafio integrar as novas
tecnologias à cultura, um conjunto de crenças, atitudes e valores. No entanto,
torna-se possível quando cultura está associada ao conceito de “habitus”. Nessa
perspectiva, a cultura não é considerada um conjunto de crenças e valores, mas
o “todo o modo de vida” que inclui práticas e rotinas (MANSEAU e SHIELDS, 2005). Bourdieu (2003) referiu-se a esse
conjunto de predisposições que orientam as improvisações nas rotinas diárias
como “habitus” ou saberes práticos como rotinas repetidas. Um ponto forte na
compreensão da cultura como “habitus” é que as rotinas podem ser observadas e
documentadas, enquanto valores e crenças devem ser inferidos, tornando-os menos
passíveis de pesquisa. Resulta-se que, em vez de formular o controle de risco
como uma quebra de hábito, pode ser mais útil conceber a mitigação de risco de
SST como um processo. Este permitirá que as pessoas demonstrem sua própria
propensão à adoção (processo de decisão-adoção) de forma adequada.
Assim, o “habitus”, conjunto de rotinas práticas e
disposições para determinadas formas de resolução de problemas, é sugerido como
uma abordagem inovadora para a gestão de riscos de SST integrada à cultura de
segurança. Combinar a mitigação de risco como um processo contínuo de
controles, em vez de um grupo de pontos de verificação estáticos de controle,
com um processo de treinamento de segurança baseado em “habitus” pode não
apenas mitigar o risco de SST, mas também complementar a produtividade e o
crescimento sustentável da empresa.
4.
UM PROTÓTIPO DE APLICAÇÃO EM TREINAMENTO DE SEGURANÇA ELÉTRICA
A seção a seguir demonstra uma aplicação do conceito
de “habitus” para treinamento de segurança elétrica por meio de um protótipo de
realidade virtual. Desenvolvedores de empresas ligadas a equipamentos móveis,
como celulares e tablets, criaram aplicativos usando a tecnologia de Realidade
Virtual Móvel (MVR) destinado a aumentar ainda mais a probabilidade de adoção
para a natureza mutável da indústria.
4.1.
TECNOLOGIA DE REALIDADE VIRTUAL MÓVEL
O MVR é uma aplicação da simulação de Realidade
Virtual (VR) em dispositivos móveis/portáteis conectados à tecnologia de nuvem
para usuários finais. Ele permite a simulação segura de eventos da vida real em
um ambiente digital que poderia ser muito perigoso ou caro para se criar (HALLER et al., 1999). A realidade
virtual é descrita como um mundo tridimensional a partir de uma visão em
primeira pessoa que está sob controle em tempo real do usuário (Bowman et al.,
2005). Também tem a capacidade de criar um exercício de aprendizagem baseado em
problemas que reproduz o ambiente de trabalho real do grupo usado como piloto,
os trainees (MCALPINE e STOTHARD, 2003).
Os programas de treinamento via VR oferecem uma
experiência de aprendizado interativa, ativa e cognitiva para o usuário (MUNRO et al., 2002; STANNEY e ZYDA, 2002).
Como resultado, eles são frequentemente usados no lugar de treinamento no local
de trabalho ou simulação em tamanho real. Aplicado ao setor de construção, o
MVR supera as barreiras de tempo e localização para os trabalhadores e oferece
mais flexibilidade de acesso.
O MVR também beneficia os trainees com um ambiente de
treinamento participativo. Esse treinamento traz um aspecto da vida real em um
cenário “isso pode acontecer com você” e permite que os treinados relacionem
condições e regulamentos com situações da vida real e uma importância de vida
ou morte (ZHAO et al., 2009). O
melhor cenário é quando as pessoas não precisam pensar conscientemente a fim de
seguir os procedimentos de segurança porque isso é uma segunda natureza para
elas (TRYBUS, 2008). Além disso, o
MVR oferece aos trainees a capacidade de experimentar sem se preocupar com as
repercussões do mundo real e a capacidade de aprender fazendo. Com um programa
MVR, o usuário controla os objetos e combina isso com informações e testes
posteriores baseados em tarefas, criando assim uma experiência interativa e de
aprendizado ativo.
Mais importante ainda, a simulação MVR pode contribuir
para a construção de uma cultura de segurança em termos de rotinas práticas
seguras. Por meio dessa tecnologia, os programas de treinamento podem permitir
que os trabalhadores da construção civil estejam familiarizados com os riscos comuns,
incluindo riscos elétricos perigosos, e simular práticas de prevenção
relevantes sem repercussões reais de lesões. Isso pode não apenas melhorar a
conscientização dos trainees sobre os riscos potenciais em um ambiente de
trabalho baseado na realidade, mas também influenciar inconscientemente os
comportamentos de rotina como uma segunda natureza, o que levará em grande
parte à cultura de segurança.
4.2.
DEMONSTRAÇÃO DO PROTÓTIPO
Foi desenvolvido um protótipo do aplicativo de
treinamento em SST integrado ao MVR, na tentativa de transferir as práticas
seguras dos trainees em um mundo virtual para suas rotinas em situações reais.
Espera-se que os trainees estejam preparados para suas futuras tarefas
elétricas, ensaiando em um ambiente virtual. O objetivo do ensaio repetido não
é apenas aprimorar as habilidades profissionais dos treinados, mas também, mais
importante, ajudar a construir seu “habitus” para práticas seguras.
O conteúdo do treinamento compreendeu uma variedade de
cenários de construção civil nos quais os acidentes elétricos ocorrem
frequentemente. O cenário designado foi baseado nos resultados do estudo de
Zhao et al. (2014) que, usando métodos estatísticos, generalizou as
características típicas da circunstância de eletrocussão na indústria de construção
civil. O protótipo incorporou essas características em um cenário que era um
canteiro de obras de estradas com linhas aéreas cercadas (Figura 4). O
desenvolvimento do cenário incluiu dois aspectos principais: modelagem do
ambiente e codificação do livro de históricos (de riscos, incidentes e
acidentes). A modelagem do ambiente simulava objetos e personagens relacionados
à construção civil, enquanto a codificação do livro de históricos ligava esses
objetos e personagens a riscos elétricos ocultos. A modelagem e codificação
foram concluídas usando o pacote Autodesk 3DS Max e Torque 3D.
Figura
4. Desenvolvimento de aplicativo protótipo
Fonte:
Zhao et al. (2014).
Dentro do protótipo, um exemplo de rotina de prática
segura foi realizar uma pesquisa no local para possíveis riscos antes de
iniciar os trabalhos, pois essa medida de controle de risco está listada entre
as cinco principais sugestões para evitar eletrocussão pelo Ministério do
Trabalho e Emprego. As investigações de acidentes mostram que este procedimento
é fundamental para que os trabalhadores obtenham conscientização sobre os
riscos, mas muitas vezes foi esquecido na prática real. O protótipo simulou várias
ações de levantamento do local, algumas das quais eram frequentemente ignoradas
pelos trabalhadores em tarefas reais. Por exemplo, os trabalhadores precisam
verificar se as linhas de energia aéreas estão energizadas ou verificar a
distância segura entre a máquina e a fonte de eletricidade.
O aplicativo simulou essas ações de rotina no cenário
prototipado, no qual os usuários devem concluir os procedimentos necessários de
pesquisa do local, detectando e eliminando os perigos. Seguindo as instruções,
o usuário também deve repetir a tarefa de levantamento de perigos em intervalos
específicos. A repetição foi projetada com base no mecanismo de memória e ajuda
os usuários a promover as melhores práticas de segurança na construção civil em
sua mente. Se o usuário falhar, uma animação de falha aparecerá e ilustrará o
resultado de possíveis lesões.
A tecnologia MVR supera as limitações de tempo e local
do treinamento e facilita os ensaios obrigatórios e eficazes no mundo virtual.
Como resultado, ajudará a estabelecer o conceito de mitigação de riscos de
segurança como “habitus” na mente dos trabalhadores e a colocar o “habitus” no
contexto das práticas do mundo real. Dessa forma, o conhecimento e a
conscientização podem ser transferidos para as rotinas práticas de SST dos
trabalhadores – a cultura de segurança.
Embora o aplicativo pretenda ser acessível online, as
configurações de servidor e rede ainda não foram concluídas para o protótipo.
Enquanto o protótipo atual tem acesso restrito para o processo de desenvolvimento,
o aplicativo final estará disponível para download na internet e utilização sem
fio. Ainda assim, recursos portáteis são necessários para se adequar à natureza
fragmentada dos projetos de construção e à alta mobilidade dos trabalhadores da
construção civil. Portanto, a versão atual do protótipo está disponível no
Tablet (Figura 5), mas será estendida para suportar as plataformas iOS e
Android.
Fig.
5. Interface de protótipo no Tablet
Fonte:
O autor.
5.
CONCLUSÃO
Em uma organização, Segurança e Saúde no Trabalho
(SST) é o componente chave da gestão de riscos para a indústria. Sabendo disso,
a tecnologia que já vem sendo empregada frequentemente para diminuir e até
mesmo mitigar os riscos pode ser utilizada para influenciar ativamente as
práticas de segurança dos trabalhadores em tempo real e de forma mais ativa.
Situações de perigo e consequentemente os acidentes, comuns do dia a dia das
operações, são trazidos a um ambiente virtual de simulação, o que tende a
proporcionar uma reflexão maior por parte dos colaboradores e resultados mais
expressivos.
Esta pesquisa examinou os riscos de segurança elétrica
na construção civil e analisou a possibilidade de integrar o “habitus” de
segurança na mitigação de riscos de SST por meio do uso de um aplicativo de
realidade virtual móvel. A análise descobriu, de acordo com as referências, que
uma grande parte das fatalidades e lesões de SST está relacionada a atos
inseguros dos trabalhadores e à falta de conscientização sobre os riscos de
SST. A formação (treinamento) acaba por ser uma abordagem eficaz e direta para
resolver este problema, mas, em situações da vida real, os programas de
formação em SST não são tão eficazes como poderiam ser. Esta falta de eficácia
pode ser atribuída ao conteúdo utilizado para treinamento, bem como à natureza
da indústria da construção civil.
Assim, foi apresentada uma abordagem inovadora para a
mitigação de riscos de SST integrada à cultura de segurança. Esta pode
beneficiar diretamente o desempenho de segurança dos trabalhadores e também ser
incorporada às práticas de segurança dos trabalhadores por meio de tecnologia
da informação de ponta com o conceito de “habitus”. Um aplicativo protótipo
para treinamento em SST que utilizou tecnologia de Realidade Virtual Móvel
(MVR) foi demonstrado para ajudar a estabelecer a cultura de segurança nas
práticas diárias dos trabalhadores e, finalmente, mitigar os riscos de SST em
projetos de construção.
Importante observar que, embora esta aplicação de
mitigação de riscos de SST seja demonstrada em um estudo piloto sobre segurança
elétrica, ela não se limita necessariamente a esse setor da indústria e pode
ser adaptada a outros riscos de SST. Enquanto isso, embora esta discussão do
protótipo represente apenas uma validação preliminar para a aplicação com
utilidade de MVR, existem muitas limitações na avaliação, como um pequeno
conjunto de amostragem e falta de grupo de controle para comparar a eficácia do
treinamento. Trabalhos futuros validarão ainda mais o desempenho do aplicativo
no campo da indústria da construção com empresas reais.
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APÊNDICE- NOTA DE RODAPÉ
2. Etapas do fluxo de trabalho que tem o objetivo de
amadurecer e validar ideias antes de aplicá-las no mundo real.
3. Etapas seguintes do fluxo de trabalho a partir de
itens gerados no upstream.
Mestrado em Engenharia de Produção pela Universidade
Federal do ABC-UFABC. MBA em Engenharia e Gestão da Manufatura e Manutenção
pela Universidade São Paulo-USP. MBA em Gestão Empresarial pela Fundação
Getulio Vargas-FGV. Pós-graduação em Engenharia de Segurança do Trabalho pela
Faculdade Educamais. Graduação em Engenharia Elétrica pelo Centro Universitário
da FEI. ORCID: 0000-0001-7667-0973.
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